Ora
bem. A Maratona de Berlim foi no domingo dia 16 de Setembro. Mas voltemos um
pouco atrás, voltemos ao domingo anterior, dia 9 de Setembro pelas 23h30 ali
pela margem do Douro por baixo da ponte do Freixo.
O
quadro habitual de uma beleza que nunca cansa, por mais vezes que se treine por
lá é sempre espectacular. As luzes das margens do Douro a reflectir na água, as
pontes tão diferentes umas das outras e ali mais ao fundo o Porto, com as suas
colinas com casas estreitas e coloridas, as luzes que iluminam tão bem os edifícios
históricos. Espectáculo.
Hoje
está um pouco de nevoeiro o que dá uma pincelada um pouco diferente ao quadro.
Vindos do Porto em direcção ao freixo vem dois vultos, um mais alto, outro mais
baixo, ambos a arfar e a progredir com muita dificuldade. Estão a chegar de um
treino de 20km e os músculos das pernas estão a ganir… 12km corridos sem parar e o resto alternando 1km a andar e 1km a trote. Uma catástrofe a forma
como terminam este treino. Estamos lixados!!! Como iremos conseguir acabar a
Maratona de Berlim? Não fazemos a mínima ideia!
Voltemos
o filme mais um pouco para trás … uns dias, umas semanas ou até uns meses. Não
temos corrido … nem um nem outro. Uma corrida ou outra esporádica não conta.
Malditas lesões musculares que me assolam novamente desde os Caminhos do Tejo,
ou no caso da Dora uma canelite fortíssima que lhe apanha o gémeo e impede de
correr. Em Agosto os km a correr não chegaram aos 30km e nunca acima dos 10km
cada. Em Julho não tinha sido melhor. Correr uma Maratona seguida? Missão Impossível
… os 330km caminhados no Caminho de Santiago poderiam ajudar na resiliência,
mas era só.
Mas
Berlim é especial!!! Porque é uma Major, porque a presença foi por sorteio e
bem paga e porque tínhamos uma semana de férias marcadas e paga para conhecer a
cidade J … vamos estar na linha de partida, isso era mais que
certo. Tínhamos 6h15m para terminar e uma táctica para o conseguir … o teste
dessa táctica correu pessimamente mal, a sério … não me lembro de um empeno tão
grande … 2h20min para 20km e estava pior do que quando acabei os 148km dosCaminhos do Tejo, apenas há 3 meses atrás.
A
semana que antecedeu a Maratona foi fantástica. Chegamos na 2ª feira antes e
palmilhamos Berlim (e Potsdam) de fio a pavio … saíamos às 9h, regressávamos às
19h para jantar e voltávamos a sair até à meia-noite, no mínimo. Há que
aproveitar o que Berlim oferece, e oferece muito, muito mesmo. Não contabilizei
os km feitos a pé nestes dias mas certamente sempre acima dos 20 porque
efectivamente nunca paramos a não ser para dormir.
1 dia num dos maiores jardins zoológicos do mundo … fantástico
a experimentar as especialidades … a Curry Wurst ...
Porta de Brandenburgo "at night"
para desenjoar jantamos e muito bem, algumas vezes em casa
sabiam que Potsdam tb tem uma Porta de Brandenburgo, menos conhecido mas mais antiga que a de Berlim? .. não? Agora já sabem … Potsdam vale bem a visita ...
Bairro holandês em Potsdam
A encher o bandulho … é preciso energia não é?
umas das minhas partes preferidas … Check-Point Charlie .. onde se respira história (e é preciso ter cuidado com as carteiras)
ainda dá para saltar? … tá bom
fodaice … até aqui ...
Potsdamer Platz … super moderno
A
partir de 4ª feira tivemos a companhia da tropa “Perneta” … como sempre nestas
coisas de Maratonas no estrangeiro, a coisa faz-se em família. E é mesmo
família … Pernetas, mulheres e filhos J … e a coisa flui de
forma automática. Há um entendimento que não se explica … e a diversão é
garantida J
só faltava o Hélder que só veio na 6a
Berlim é uma miscelânea de tudo, desde os povos, raças, artes, moderno e antigo
e descobrimos uma cervejaria típica de …. Munique :)
cervejaria bem preparada para a malta despejar as litradas
tudo nas cervejas e um no Capuccino … tá acabado o moço
Check-Point Charlie de dia …
aqui passava o Muro original ..
Porta de Brandenburgo de dia ...
os preparativos para a Maratona já eram visíveis por todo o lado
e como ainda não tínhamos feito o suficiente porque não subir os centenas de degraus para ir ver as vistas da estátua do anjo?
valeu a pena...
Maravilha ….
no sábado fomos levantar os dorsais … e deixar a nossa marca
equipa maratonista completa ...
à noite voltamos à cervejaria ...
era preciso hidratar bem para a Maratona do dia seguinte …
Vejam a forma apoteótica dos Pernetas a sair da Cervejaria com quase 1000 pessoas lá dentro
Estamos de novo no dia 16 de Setembro, na linha de partida da Maratona. Faltam poucos minutos para o tão desejado tiro de partida. As pernas estão pesadas de tanto km feito nos dias anteriores. Já não estava nervoso … já tinha estado, na noite anterior antes de adormecer. Raramente fico, mas ir para uma Maratona sem estar minimamente preparado deixou-me assim … mesmo tendo combinado com a Dora que faríamos só o que fosse possível e se não acabássemos que se lixasse. Mas queria mesmo acabar … estar ali naquele ambiente ainda me fazia mais querer conquistar a Maratona. Iria ser diferente de todas as outras 11 (sim, eram mesmo 11) que já tinha feito até à data.
é muito SWAG … então o Badolas de banana na mão
é o que digo … muito Swag …
heheheeeee…. festa ….
Quase quase….
E lá se
deu o tiro de partida … juntamente com a Dora e todos os Pernetas - eramos 6 no
total. Saímos todos juntos e a festa começou desde o primeiro metro … dentro de
fora do “relvado” J.
A táctica era correr 10km seguidos e depois entrar no esquema “Corrinhar” … correr e caminhar até ao fim. A estratégia foi adulterada logo ao início.
Feita …
Corremos
quase 15km seguidos … e rápido demais para a nossa condição. “Culpa” da euforia
de estar a correr a Maratona de Berlim, de ir com os outros Pernetas, do
público empolgado que não nos dava descanso com tanto apoio e mais do que isso
tudo, uma certa “vergonha” de começar a caminhar com tão poucos km percorridos.
Esta
corrida é a dois se é que ainda não tinham reparado. Apenas me juntei
verdadeiramente à Dora por volta dos 10km, que ia um pouco mais à frente na
companhia do Américo. Eu ia com o Helder uns 100m atrás na converseta.
“não
achas que vamos rápido demais?” perguntava eu… ia bem, muito melhor do que no
treino de domingo passado … “corremos até aos 17km e depois entramos na nossa
táctica” … porquê 17 não sei J
Mas não
chegamos lá … o peso anormal das pernas chegou de fininho e bem rápido, mais à
Dora do que a mim pelo que pouco depois dos 14km começou a “corrinhada” da
nossa Maratona. E não pensem que foi fácil …
São
45.000 Maratonistas … embora as estradas sejam largas não há espaço … lá nos
encostamos a um dos lados e começamos a caminhar, tentando atrapalhar o menos
possível quem queria correr. A multidão na berma da estrada virou as atenções
para nós … “Carlooooos” … “Doraaaaa” …. é só incentivos, em todas as línguas
que possam imaginar.
Um
“you´re looking great” ficou-me na memória … acho que o senhor era irlandês …
soube tão bem … e tinha razão … estávamos com óptimo aspecto. As pernas doíam,
mas tínhamos entrado no espirito daquela Maratona … high-fives eram mais que
muitos, palmas, agradecimentos e acima de tudo sorrisos. Estava a adorar aquilo
… de tantos e tantos que falaram para nós só me lembro de um de que não gostei
… um velhote alemão que disse qualquer coisa como “isto não é para namorar, é
para correr” … em situação normal talvez tivesse razão mas naquela situação era
a única forma de chegar ao fim. A dois J, a “namorar” …
perdoei-lhe porque ele não podia saber JJJ
E assim
fomos, a “corrinhar” … caminhamos menos do que apetecia porque as zonas mais
centrais com muita gente não “deixavam” J … abastecemos sempre
bem em líquidos e de vez em quando uma banana e maça e aproveitamos uma ou
outra casa de banho pelo caminho J … boa desculpa para
descansar.
Passamos
a meia-maratona com 2h02min. Fizemos os 20km ca.25min mais rápidos que no
treino da semana anterior e estávamos um bocadinho melhor fisicamente. Sigaaa….
O apoio
nas bermas da estrada é impressionante … não há zonas com pouco público … há
zonas com público, zonas com muito público e zonas com multidões impressionantes
… bandeiras de tantos mas tantos países, claques enormes organizadas (lembro-me
dos dinamarqueses), os mexicanos eram dos mais entusiásticos (ainda mais que os
outros), brasileiros, americanos, japoneses, espanhóis (tb muito
entusiásticos), franceses, irlandeses, alemães e tantas outras bandeiras … e
portugueses? Acreditam que vimos a primeira bandeira tuga apenas aos quase
40km? A sério … procuramos tanto, queríamos fazer a festa com os tugas por
caminho e não havia … pelo menos não que tivéssemos visto.
Isto
não quer dizer que não tenhamos feito “festa” com tugas que estavam a correr a
Maratona. Houve vários que nos ultrapassaram com os quais trocamos incentivos e
cumprimentos J … havia camisolas de todas as zonas do país, Cães da
Avenida de Gaia, Viseu, Setubal, Lisboa e até uma do Ronaldo J … e havia um grupinho com quem nos cruzamos várias vezes
… eram 3, uma mulher e dois homens … um deles estreava-se na Maratona e os
amigos estavam a apadrinhar essa estreia. Hoje sabemos que se chamam Alice, Zé
e Chico porque já houve contactos depois da Maratona pelas redes sociais.
Fomos
cruzando com este grupo várias vezes a partir dos 30km. Ora passavam eles
quando nós caminhávamos, ora passávamos nós quando decidíamos correr. O
estreante (o Zé) ia numa de “gru maldisposto”
já há alguns km … conheço tão bem essa fase J … não lhe adiantou de nada porque fartei-me de me meter
com ele … se o olhar matasse JJJ … as caras deles não me eram estranhas, mas sempre
pensei que fosse das corridas que os conhecesse. Apenas depois de os
procurarmos pelas redes sociais por causa de umas fotos que tiramos no fim é
que descobrimos que se tratava de jornalistas conhecidos da nossa praça.
A nossa
maratona continuava a ser uma festa, cheia de sorrisos a disfarçar as pernas
muito mas mesmo muito pesadas. Quando retomávamos a corrida depois da caminhada
era um martírio durante as primeiras dezenas de metros. Mas o que nunca faltou
mesmo foi a boa disposição. Estava melhor que a Dora que estava a “lutar”
bravamente … nada de novo, impressionante a força e resiliência que vem daquela
“pequenita” J
E assim
chegamos aos 40km … “vamos correr os últimos 2km!!” … a Dora respirou fundo e
disse “vamos ….” …
… mas
não corremos … não porque não conseguíssemos, mas sim porque ainda aproveitamos
uma casa de banho pela última vez para um xixizinho J … depois sim, corremos até ao fim ..
Ali
estava a tão aguardada e imponente Porta de Brandenburgo … há pouco mais de 3
horas tinha passado ali um gajo chamado Kipchoge a voar para um recorde do
mundo da maratona impressionante J … nós não íamos a voar,
mas estávamos a chegar tão longe como ele, um bocadinho mais lentos mas a
chegar ao destino como ele tinha chegado J … selfie … tinha que
ser …
… e retomar a corrida … da Porta de Brandenburgo até à meta ainda são uns
poucos centenas de metros … ali estava a meta … feita … juntos conseguimos JJJ
bem-vindo ao clube dos Maratonistas Zé :=
Uns
poucos metros depois da meta estão a Alice, o Chico e o novo colega maratonista
Zé. Já lhe tinha passado a parte do “gru maldisposto” … estava visivelmente
emocionado a tentar perceber como é possível ficar assim “apenas” com uma
corrida. Entretanto já deve ter percebido que não é apenas uma corrida … é uma
Maratona caraças, e foi a primeira caraças … numa Maratona carregamos muita
coisa connosco e quando passamos aquela linha de meta vem tudo ao de cima,
especialmente na primeira. Eu sabia o que ele estava a sentir J … o Zé tem um blogue (descobri isso passado uns dias,
onde escreve (e bem) sobre corrida entre outras coisas … e o Zé escreveu sobre
nós, sobre mim e a Dora … cruzou-se connosco 3 ou 4 vezes durante a Maratona,
esteve connosco uns minutos no fim e
trocamos umas mensagens para tentar resgatar as fotos tiradas. E escreveu sobre nós, sobre uma Maratona feita a dois … obrigado Zé!!!
No fim
ficamos ali, deitados na relva, de cerveja (sem álcool) na mão a descansar um
bocadinho, a absorver o ambiente e a festejar o feito – e a rir da malta a
cambalear J .. temos que nos rir uns dos outros, certo? J. Foram 5h14, 2 horas (do meu) e 1h30 (do da Dora) acima
dos nossos melhores tempos na Maratona … e foi tão mas tão fixe J
Os
Pernetas regressaram no domingo à noite, nós ficamos mais um dia e surpresa das
surpresas e ao contrário do que estava à espera não empenamos assim tanto. As
pernas pesavam, mas não invalidaram de sairmos para ir conhecer aqueles últimos
recantos de Berlim que tinham ficado para segundas núpcias.
Restaurante onde fomos almoçar .. tinha que nos calhar esta mesa…
não podíamos sair de Berlim sem experimentar a verdadeira ..
a despedida … havemos de voltar...
Faltam os agradecimentos … obrigado a todos que nos apoiaram, mais uma vez montes de mensagens J. Á família Perneta (os que estiveram e os que não estiveram), mais uma vez foi uma pernetada muito boa e divertida – mantivemos o lema “quando corre um corremos todos”. Por fim à Dora … tínhamos conseguido sozinhos? Sim, acho que sim … mas não tinha sido a mesma coisa J
NOTA 1:
um dia gostava de voltar a Berlim para correr a Maratona, bem treinado para
tentar um brilharete. Acho que é mesmo a Maratona perfeita para se conseguir um
tempo canhão. O percurso plano, o tipo de piso e aquelas centenas de milhares
de pessoas que te “carregam” são umas mais valias importantíssimas. Não é por
acaso que o recorde do mundo já cá foi batido várias vezes.
NOTA 2:
por falar em recorde do mundo, eu estive presente!!! J não é mentira nenhuma eu dizer que fui sempre atrás do
Kipchoge JJJ … sabiam que aqui o vosso amigo também esteve presente
na prova em que se bateu o recorde do mundo da meia Maratona, em Lisboa? Ainda
hoje é válido!!! Resumindo, eu estive nos dois recordes do mundo, da meia e da
maratona J … não pode ser coincidência. As organizações com
aspirações deviam ter isso em conta e no mínimo convidarem-me para as suas
provas … não acham?
NOTA 3:
a Maratona de Berlim é cara … a inscrição custou 114 €. Tens direito a dorsal e
a uma medalha de finisher se chegares ao fim. A T-Shirt custa 30 € e a Pasta
Party 20 € … e é para quem quer, que não foi o meu caso. Basta-me a bela da
medalha J
Um dia
vou voltar a correr a Maratona de Berlim!!!