quinta-feira

GR60 - Aventura pelas Montanhas Mágicas - dia 3

 

depois da tempestade vem a bonança

Etapa 12 – Sever do Vouga – Felgueira (27,8km, 1140D+, 625D-)

Onde é que a gente ia? Ahhh ..

“Acordei uns 15 ou 20minutos depois novamente a tremer como varas verdes … tinha uma mensagem do pessoal a dizer que estavam na padaria … ao sair do carro doía-me tudo, virilhas, pés, pernas e não conseguia para de tremer … entrei na padaria, dirigi-me ao pessoal e disse “eu fico por aqui, desisto….””

Oh páh … eu dava tudo para ter um registo das caras dos meus amigos de aventura neste momento … ali estavam aquelas almas penadas, piores que um chapéu de um trolha, tão destruídos como eu e vem um caralho como eu dizer “eu desisto” … não houve uma palavra sobre a minha vontade em desistir … o Lima levantou-se e disse-me “senta aí” e foi-me buscar um café quente e uma sande de queijo … o Domingos embrulhou-me na sua manta térmica … o Lobo olhava para mim e pensava “what the fuck???” …

… senti vergonha, confesso … estava a escolher o caminho mais fácil … tudo isto se passou num minuto, o tempo suficiente para eu juntar os remendos em que estavam o meu corpo e a minha alma e dizer para mim mesmo … desistes o caralho!!! Agora vais com eles até ao fim …

txiii .. como te puseste rapaz

O cafezinho, o pãozinho com queijo mas ainda mais o “mimo” aqueceram a alma e o corpo. Já não tremia .. estava destruído mas não tremia. Tomo decisões rápidas mas que foram as mais acertadas … mudei de meias e calcei as sapatilhas de estrada, mais confortáveis, menos estáveis. O suficiente para me sentir melhor dos pés que já apresentavam as primeiras bolhas, mas muito longe do habitual. Enchi os flasks e preparei tudo para uma etapa longa até Felgueira. Vamos caralho …


tem que ser ...

oupas

tou lixado para os aturar

nunca mais uso meias de compressão

tenho que ter uma paciência

O tempo continuava instável, mais aberto mas ainda apanhamos alguma chuva na primeira meia hora. Depois abriu totalmente e tivemos sol o resto do dia.

Demoramos uns bons 20min a entrar no ritmo, depois os pés e as pernas voltaram a estar em condições … incrível .. como num momento estás que nem um passo consegues dar sem teres dores em todo o lado, e a seguir estás a correr a um ritmo razoável ou a subir rampas em caminhada forte sem grandes problemas. E querias tu desistir, morcão!!!



Esta etapa embora dura pelo desnível positivo que tinha não nos custou muito … os km fluíam bem. A Dora ligou a dizer que havia um restaurante em Felgueira e que fechava a cozinha às 14h … estava a tentar convencer o dono a guardar 6 sopas pois não sabia se chegaríamos a tempo. Pelos vistos não lhe resistiram ao charme, e as sopas pelo menos estariam garantidas. Mesmo assim o objectivo passou a ser chegar a Felgueira antes das 14h.

O Domingos e o Lobo arrancaram mais fortes ainda com 10km feitos … queriam tentar dormir um pouco em Felgueira. O Leandro voltava a acusar desgaste, especialmente quando subia muito (falta de treino com desnível … da próxima não falha 😉) e só dizia “raio dos velhotes” 😊 …. Eu e o Lima fomos ficando com ele, sempre um pouco mais à frente para não o deixar “amalandrar muito”.


E assim fizemos todo o percurso … quando faltavam 3 ou 4 km tb eu e o Lima arrancamos e chegamos uns bons 20min antes das 14h … o Leandro viria ter ao Restaurante.

sexy mother focas

O restaurante é Top … e estava cheio de gente bem cheirosa para o almoço em família, tb havia um grupo grande de motoqueiros … e nós todos suados e sujos …csafoda … venha mas é a sopinha e algo mais … topem o repasto … que maravilha.





Agora vinha uma etapa mais curta até ao Merujal … iriamos subir a Freita por um lado e descer pelo outro num percurso que me parecia acessível e bonito.

 

Etapa 13 – Felgueira-Merujal (12,8km, 415D+, 650D-)

Mas depois do almoço deu aquela moleza e o soninho voltou. Juntou-se a nós a Teresa, esposa do Domingos para acompanhar nesta etapa.

Houve divisão do grupo para esta etapa. O Domingos seguiu com a Teresa. Eu, o Lobo e o Leandro (que voltava a estar branco e maldisposto) decidimos dormir uma sesta de 30min. O Lima decidiu seguir sozinho e esperar no Merujal por nós.

Mesmo com uma barulheira do caraças dos gajos do café, das motas do motoqueiros dormi que nem um bebé deitado num pedaço de relva em frente ao restaurante. O Lobo e o Leandro tb, assim como um canito que deve ter achado piada aos novos companheiros de sesta 😉 … quem tb fez a sesta foi a Dora, mas no carro. Isto de acompanhar uma coisa destas não é nada fácil.


lol


Exactamente 30min depois toca o meu despertador … acordar o Lobo, preparar a coisa e siga. O Leandro tinha decidido ficar mais um pouco, a ideia era fazer mais esta etapa e a Flávia o vir buscar.

Esta etapa foi muito tranquila … fui o tempo todo na letra com o Lobo … depois da grande subida, corremos uns poucos km um pouco acima dos 5min/km … incrível, depois de 250km nas pernas, e depois de termos passado pelo que passamos.



A meio recebo uma chamada do Leandro um pouco aflito …

L - “Carlos, está aqui um Boi no meio do trilho”

C – “txiii … está a olhar fixamente para ti?” a rir-me por dentro, pois era um vaca, daquelas típicas e inofensivas que andam a pastar soltas por toda a Freita, e sabia exactamente qual era pois tínhamos passado por ela no trilho há uns minutos atrás … até falei para ela e de facto ela olhou-nos fixamente..

L – “sim, está!

C- “tás fodido moço, se puderes foge” …

L- “tás a falar a sério?” … não me contive e escangalhei-me a rir

C- “és mesmo menino da cidade caralhes … é uma vaca páh, e não fazem mal a ninguém … “

Acho que me fui a rir durante uns bons km … Leandro – para a próxima aventura, treino com desnível pelos percursos da Freita, ou do Marão, ou de Montemuro … para treinar as pernocas e te habituares aos animaizinhos das serras 😉

o "touro" era esta menina 

Ainda me estava a recompor desta história engraçada e liga-me o Lima … “acho que me perdi, segui o PR7 …” … não acredito, tantos percursos para se enganar e foi escolher logo o PR7, um dos mais difíceis … a sorte é que passa ao Merujal. Este Lima não existe … pior orientação que ele só mesmo o nosso Américo, o GPS humano 😊



mais uma marca importante ...

Chegamos ao Merujal e fomos ao café do Parque de Campismo beber uma Cola gelada (eu) e uma Super Bock (o Lobo). Não havia rede, não conseguia contactar a Dora mas sabia que estaria algures por ali. E estava um pouco mais abaixo, com o Domingos, a Teresa e o Lima tb já tinha chegado.


Toca a preparar para a última etapa … vamos voltar a Arouca.

 

 Etapa 14 – Merujal-Arouca (23km, 600D+, 1205D-)

Teresa & Dora ... equipa de apoio do Merujal

sigaaa ....

23km para acabar esta aventura. Sentia-me mesmo bem e o mesmo sentimento parecia-me transversal aos meus amigos. Apenas o Lima estava com uma corrida um pouco forçada … com um percurso maioritariamente a descer e plano corremos muito … eu tive uma paragem técnica para soltar uns javalis e corri abaixo dos 5min/km para apanhar os meus compinchas … incrível … a este ritmo chegamos antes das 21h.


Mas seria fácil de mais, não acham?

A partir de um terço da distância começamos a entrar naqueles trilhos típicos da Freita, muita pedra que ao início ainda se aguenta bem, mas com o tempo se torna chato e massacrante. É um dos motivos porque não me aventuro muito em provas pela Freita. E foi aqui que o Lima voltou a ter dores fortes nos pés e nas canelas.

Entretanto liga o Luis Teixeira que já tinha chegado a meio da tarde a Arouca – maquinão 😉 … queria saber a que horas prevíamos chegar, queria estar connosco no fim. Aponta para as 22h, talvez um pouco antes.

Nesta longa etapa a tortura tb é psicológica … é que começas a ver Arouca lá no fundo logo por volta dos 5km … mas o percurso leva-te a passar Arouca e a ir “passear” por umas aldeolas (espinho por exemplo) na direcção contrária sem aparente necessidade nenhuma. É que aqui já só vais a pensar em chegar.

Várias vezes passas por cruzamentos com estradas em que tens placas a dizer “Arouca” enquanto o percurso segue em sentido contrário. O Lima várias vezes, no desespero, disse para irmos directos a Arouca, que já chegava, que tínhamos km a mais, bem acima dos 275km que a rota indicava. Mas eu não deixei …


A tentação foi grande, mas é para fazer a rota … bem me custou insistir, por ele, confesso. O Lima ficou lixado, bem notei … mas foi. Entretanto escureceu, tivemos que voltar a colocar os frontais … faltavam 6km e o Domingos recebe uma chamada … ficou para trás. Pouco depois, como que possuído pelo diabo, passa por nós a grande velocidade a dizer “só paro no carro” … cada um com a sua maluqueira…😉


A minha preocupação era o Lima … ele nestes últimos km mostrou a raça de que é feito … até doía a alma ver aquele gajo a sofrer atrozmente das canelas e dos pés e mesmo assim a tentar correr nos planos e nas descidas para despachar a coisa e não nos atrasar mais. Várias vezes nos disse para irmos andando. mas isso, como é lógico, estava fora de questão.

O Lobo ia abrindo caminho, o Lima no meio e eu fechava a comboio … houve momentos em que só me apetecia pegar no velhinho ao colo e carrega-lo até à  meta .. mas o gajo é grande e pesado, e careca 😉.

Tentava distrai-lo com conversa de chacha mas não funcionava… houve uma altura em que ia atrás dele e só o ouvia a gemer a cada passo de corrida em que fiquei com os olhos húmidos … deve ter sido algum mosquito que me entrou no olho … fonix .. que herói … ir ali, com umas pernas pesadas mas ainda na boa era para meninos .. ir ali no estado em que ele ia já não é para qualquer um … grande Lima, é o maior.


Finalmente Arouca … ligo à Dora a dizer que vamos chegar pela Camara Municipal e descer a avenida principal … ela diz que vem ao nosso encontro …

Fazemos o último km a caminhar … a curtir a chegada … o Lima já se ri, já diz piadas, as emoções estão à flor da pele …tá feitinho e muito bem feito. A Dora filma o momento …

Reencontramos o Domingos, seguimos para junto dos carros, e entretanto chega o Luis para os abraços e fotos finais.

a Dora faz parte desta aventura ...


os maiores!!!

Estava na hora de regressar a casa, tomar um banho … ainda comi 2 mistas e 1 malga grande de Nestum antes de me enfiar na minha cama … que maravilha sentir o conforto da nossa cama ao fim destes dias … adormeci rapidamente com aquele sentimento bom, orgulhoso do feito, feliz pelo que tive oportunidade de viver nestas quase 70 horas de aventura.

Haverá mais um post para fechar esta aventura, faltam os agradecimentos, faltam algumas conclusões, … quem sabe amanhã!!!

quarta-feira

GR60 - Aventura pelas Montanhas Mágicas - dia 2

 

brutal ...
 

Etapa 6 - Gralheira-Castro Daire (29,7km, 495D+, 980D-)

Mais uma distância longa (a etapa mais longa de todas) mas com pouco desnível, à partida muito corrivel.

Retemperados, agora a 3, saímos pouco passava das 5h, ainda noite escura.... mas pouco tempo depois tivemos direito a mais um amanhecer brutal que encheu o que faltava das nossas baterias.







Esta etapa é absolutamente linda a nível de cenários.... tomamos o pequeno-almoço junto à uma fonte no meio do nada... para ser perfeito só faltava o café... bem que o procuramos nas aldeias que íamos passando mas sem sucesso.








Foi mesmo uma etapa linda, em que estivemos sempre bem dispostos e em que corremos bastante. Até demais... a 2km de Castro Daire dou um bico num toco e mando um tralho que nem é bom... tive sorte, apenas uns riscos na pintura. O árbitro nem amarelo mostrou 😉.

Tínhamos o Domingos à nossa espera numa padaria no centro de Castro Daire. O Luis tinha seguido viagem sozinho. Descansamos um bom tempo, café, coca cola, torrada, doce, água... era preciso carregar energias que a próxima etapa era das duras.


que seca a esperar por nós ...

Era preciso subir ao S. Macário...

 

Etapa 7 - Castro Daire - S. Macário (20,3km, 1020D+, 625D-)

Estava cá uma tosta … mas continuava tudo bem disposto e os km saiam a bom ritmo. A primeira metade é maioritariamente a descer até ao rio para depois ser sempre a subir até ao alto de S. Macário.







é ali pra cima que vamos...

150km feitos


parecem 3 meretrizes...

A partir daqui iríamos ter o apoio da Dora. Estava combinado o encontro no fim da etapa lá bem em cima. Com a dormida na Gralheira estávamos um pouco atrasados em relação ao plano que era chegar ao ponto de encontro inicialmente previsto em Paraduça pela hora de jantar. Tinha que ser uns bons km antes.

O calor foi o maior obstáculo nesta etapa embora se tenha suportado bem. As paisagens a subir para o alto de S. Macário foram para mim as imagens mais deslumbrantes de toda a Gr60... brutal!!!




Uma chamada para a Dora porque iriamos chegar mais cedo que o previsto… ela ainda demora uns 40 min. Sem stress, vamos tentar dormir...


Não consegui, mas fechei os olhos e descansei. Sou "acordado" por uma chamada da Dora... está num S. Macário errado, tb no distrito de Viseu mas ainda a quase 1 hora de onde nós estamos. Mudança de planos rápido.... vamos seguir e fazer a etapa até à Fraguinha... encontramo.nos lá. Sigaaaa.

 

Etapa 8 - S. Macário - Fraguinha (15,5km, 390D-, 480D+)

Nesta etapa a coisa vai sofrer um forte revês, o cenário vai mudar.

Continua tudo bem disposto, os km continuam a fluir bem....corre-se bastante.... só tenho que gerir a água que é pouca. Já não temos um ponto de água há muitas horas e com o desencontro com a Dora a coisa ficou rés vês.

Nesta etapa registam-se dois marcos importantes … o Domingos e o Lobo atingem pela primeira vez a distância das 100 milhas (160km). Valentes…

valente...

maquinão

Outro problema é que o tempo está a mudar... há nuvens e algum vento. As previsões apontavam para alguns chuviscos mas o tempo que tinha estado durante o dia não indicava nada do que iria acontecer.

topem o céu ...


Já perto da Fraguinha entramos num manto de nevoeiro, pouco depois sentimos as primeiras pingas e não tardou chovia mesmo... aquela chuva "molha tolos", estão a ver?


Merda... a Fraguinha não tem cafés.... o bar do Parque de Campismo está fechado.... ali está a Dora... mas não há sitio onde para nos abrigarmos... ficar à chuva a abastecer é a morte do artista.

O Domingos lembra-se que um pouco mais abaixo existe um coreto onde fazem um abastecimento no UTSF. Vamos para lá com a Dora. Que belo abastecimento... Sandes, Aletria que a minha mãe mandou (ela bem reclama destas minhas maluquices mas apoia em tudo), Fruta, Cerveja, Cola, água, batatas fritas, bolachas.... não falta nada… bem quase nada, falta uma sopa e um café.


qui passa moço???

A Dora tb tinha sacos com muda de roupa. Mas não faz sentido mudar pq nos vamos molhar já outra vez – chove muito. Como a Dora decidiu nos acompanhar toda a noite, a muda de roupa fica para quando o tempo deixar. Estou com frio.... continua a chover. E desejamos uma sopa e um café. Uma rápida pesquisa indica que não existe nenhum café nas próximas localidades, apenas um restaurante, mas que está fechado. A Dora liga na mesma, explica a situação, que apenas umas sopas e um café seriam uma ajuda brutal mas nada feito.

Vamos ter que andar toda a noite, quase 40 km até Sever do Vouga... será muito duro mas não temos outra hipótese. Tempo de chuva e o frio da noite... um cocktail perigoso... temos que nos manter em movimento, e sem café.

Toca a vestir o impermeável e siga para Manhouce que se faz tarde.

 

Etapa 9 – Fraguinha – Manhouce (10km, 165D+, 470D-)

Etapa curta e à partida fácil. Os km continuam a fluir mas vou preocupado … não estava a contar fazer a noite toda, a chuva mantêm-se e o impermeável faz-me sentir calor. Mas não o posso tirar, porque ficarei encharcado e com frio. Ora foda-se.


Um café … o meu reino por um café!!! Os meus compinchas tem o mesmo desejo. Entramos numa aldeia … já anoiteceu … não se vê ninguém na rua, as casas escuras sem movimento nenhum. Não me admira que não haja cafés … para quem?

De repente um casal idoso numa varanda … “ó senhores, por acaso não nos conseguem arranjar um cafezinho?”  …. Resposta negativa, mas o senhor diz que em Manhouce há um café … mentiroso do caralho.

Pouco depois liga a Dora … “encontrei um café em Manhouce, não tem sopa mas tem bebidas, gelados e café” …. Conseguem imaginar a alegria? Não só pelo café, mas pela possibilidade de um pequeno descanso num lugar abrigado.

Recebo uma chamada do Leandro a perguntar como é que as coisas estavam a correr e a dizer que ia ter connosco a Paraduça. Trás café moço!!!

Não tardamos a chegar a Manhouce e lá estava a Dora e o café aberto 😊

o nosso "anjo da guarda"


O Sérgio, filho do dono deste café conhecia o meu vizinho Porfirio, que fez a Gr60 sozinho há umas poucas semanas atrás. Pelo vistos costuma ir ali beber uma bejecas. Ajudou a quebrar o gelo.

o Sérgio ...

2 cafés, água com gás, carregar mais um pouco os telemóveis e relógios e tb as nossas baterias. Soube muito bem este bocadinho.

Lá fora entretanto a chuva tinha parado … vamos até Paraduça.


Etapa 10 – Manhouce – Paraduça (13,6km, 435D+, 700 D-)

Ainda fui ao carro da Dora encher os Flasks que faltavam … beijoca e siga. A Dora andar por ali sozinha, por aquelas estradas sinuosas no meio do nada àquelas horas, dava-me um misto de sentimentos. Por um lado, preocupava-me por outro tranquilizava-me saber que ela andava por ali perto caso precisássemos de alguma coisa.

Foi uma etapa relativamente tranquila … noite escura, muito alcatrão … põe e tira impermeável conforme começava a chuviscar ou parava de chover.

estavam a começar os problemas com os pés do Lima




E chegamos a Paraduça onde já estava a Dora e com o Leandro, a Flávia e o Pai dele a chegar ao mesmo tempo.

Tinha parado de chover … o Leandro apareceu equipado a dizer que ia seguir conosco. Tinha dormido 11 horas seguidas e sentia-se em condições. Oupas … vamos a isso.

apoio importantissimo ... 

Mas antes descansamos um pouco, bebemos café … sabíamos que a próxima etapa seria muito complicada. O dia ia longo, o cansaço era muito, os números para esta etapa metiam respeito. Mas tinha que ser … próxima paragem Sever do Vouga …




prontinhos para seguir viagem
 

Etapa 11 – Paraduça – Sever do Vouga (25,8km, 1100D+, 1200D-)

Para começar bem enganamo-nos no percurso e tivemos que voltar ao ponto de partida. O Lima afirmava convictamente que tinha visto as marcações quando foi largar uns javalis ao monte … se ele viu, quem somos nós para duvidar 😉

Seguimos na direcção que ele disse mesmo que o track estivesse a dizer algo ligeiramente diferente. Acontece que as marcas que ele viu eram amarelas e vermelhas (de uma pequena rota) e não as vermelhas e brancas (da grande rota) … e agora … voltar para trás? Nada disso … vamos pela estrada que mais à frente havemos de entrar no percurso certo …


Mas não mais conseguimos voltar ao percurso original … tentamos duas vezes e esbarramos sempre com barreiras … uma Igreja, campos sem passagem que se visse … era noite escura … solução … vamos seguir pela estrada.

uma desgraça ...


Hoje tenho quase a certeza que este engano nos salvou a aventura … pelo que se passou a seguir, acho que pelo percurso original iriamos desistir, ou iria haver mortos 😉 … com este engano “poupamos” uns 4km e muitas “chatices”.

Foi nesta etapa que entramos todos, sem excepção (talvez o Leandro menos por estar fresco), no poço mais fundo de toda esta viagem. Eu tenho perfeita noção que adormeci várias vezes em pé enquanto avançava … íamos todos com sono, cansados, esmurrados e sovados pelos muitos km deste dia … tudo em silencio, cada um nos seus pensamentos …

… eu olhava para o relógio de minuto a minuto e já não conseguia raciocinar quantos km faltavam para acabar esta merda desta etapa. Perguntava constantemente ao Lobo e as respostas dele não me agradavam nadinha … a merda dos km não andava por nada … “só me podes estar a gozar”

Estava instalado o modo “gru maldisposto” em todos os elementos da equipa, um ambiente de cortar à faca … o Lima ia num sofrimento atroz … teve que parar várias vezes, os pés dele metiam dó … e ainda faltava tanto. Num momento a sós com ele, ele diz-me “vou desistir em Sever do Vouga” … só lhe disse “tu é que sabes” …. Não eram apenas os pés, as canelas dele estavam inchadas e doiam-lhe … para o Lima colocar a hipotese de desistir é porque estava mesmo a “morrer” … estamos a falar do homem que nos Caminhos de Tejo, aos 115km com uma lesão no joelho que o impedia de dobrar a perna, queria continuar a toda a força … não tive coragem de lhe dizer para continuar.

Tinhamos a firme ideia de ir aos bombeiros de Sever do Vouga e pedir que nos deixassem dormir lá num cantinho qualquer, num solo duro mas resguardados do frio da noite. Era essa ideia a que eu me agarrava … chegar aos bombeiros para dormir.

Demorou uma eternidade … ainda por cima os bombeiros não ficavam à entrada de Sever do Vouga por onde nós vínhamos, ficavam do outro lado. Depois enganamo-nos no percurso e discutimos por que lado era mais perto … esse engano custou uns bons 500 ou 600m … um problema quando está fodido da cabeça.

Descidas ingremes corridas a grande velocidade com o Lobo … o resto da malta vinha mais devagar … a duvida “esperar ou eles que se fodam e que venham lá ter” … agora dá para rir, mas foi mesmo assim.

O que vale é que para chegar ao centro de Sever do Vouga a coisa subiu a sério e já não dava para correr.

Passamos no centro, vi o carro da Dora lá ao fundo … a vontade era ir ter co ela, mas deve estar a dormir … seriam 6h00 da manhã e já estava a amanhecer. Sigaa … ali estava ele, o quartel dos bombeiros… que rico soninho me espera …

“não temos lugar para vocês, teriam que ter feito o pedido antecipadamente” … conseguem imaginar a nossa desilusão? Que se foda … vamos dormir onde calhar … do outro lado da rua há umas galerias comerciais … perfeito … encontramos às 8h30 para seguir viagem.

Deitei-me ao melhor estilo de sem abrigo no primeiro canto que encontrei … os meus compinchas fizeram o mesmo. Acho que adormeci logo, as acordei 5 minutos depois com frio nas costas… estava deitado sobre azulejos … coloquei o impermeável por baixo e voltei a adormecer … uns 5 ou 10 minutos depois acordo a tremer de tal forma que não me conseguia controlar … aí tive receio que entresse em hipotermia ou assim… a malta parecia estar a dormir … peguei nas minhas coisas e fui ter com a Dora para mudar de roupa …

Quando cheguei ela estava fora do carro a mexer na mala … dormiu um pouco no carro, mas com o nascer do dia acordou, não estava confortável … não foi fácil para ela tb. Mudei de roupa, vesti uma Sweat quentinha e enfiei-me no carro … estava um pouco mais confortável e passei pelas brasas … ainda mandei uma mensagem ao pessoal indicando uma padaria ali para o pequeno-almoço …

Acordei uns 15 ou 20minutos depois novamente a tremer como varas verdes … tinha uma mensagem do pessoal a dizer que estavam na padaria … ao sair do carro doía-me tudo, virilhas, pés, pernas, sono e não conseguia parar de tremer .. estava completamente destruído … entrei na padaria, dirigi-me ao pessoal e disse “eu fico por aqui, desisto….”

NOTA: uma prova de que estes últimos km foram terriveis é o facto de não ter tirado uma única foto ... não havia vontade, a vontade que havia era de matar alguém ... (continua amanhã, em principio)