domingo

Lichtenstein Weg - que bela jornada

O despertador tocou pouco passava das 4 da manhã. Estou cheio de sono, ouço a chuva a cair lá fora … ligo a net do telefone, vou espreitar as previsões para o dia seguinte na esperança que sejam melhores. Mas não, no dia seguinte vai estar como hoje. Ainda pensei em desistir da ideia, de durante o dia fazer um outro tipo de treino longo. Mas caraças, quando é que vais ter uma oportunidade de fazer isto? Vamos mas é embora … foi só vestir o equipamento, pegar na mochila pré-perada de véspera e sair do hotel. 

Fazer o Liechtenstein Weg obriga-me a uma logistica complicada. O Hotel que escolhi teve o preço como um dos factores principais … marquei umas horas antes de cá chegar, quando já vinha a caminho … nem sabia bem onde ficava e foi surpresa quando vi que ficava numa aldeia idilica tipica dos Alpes, no meio de montanhas fantásticas a 1500m de altitude no centro do Liechtenstein. Por outro lado obrigava-me agora a uma viagem de carro de 40min até posto fronteiriço ao lado da Austria, em Schaanwald para depois apanhar um autocarro para Balzers na outra extremidade do Principado, fronteira com a Suica a ca.25km de distância e que demorou outros 50 minutos a fazer. Durante esta viagem nasceu o dia e a chuva parou … sabia que seria por pouco tempo, porque as previsões apontavam para chuva durante o dia todo … mas se pudesse começar sem chuva seria espectacular. Cheguei a Balzers com o seu Castelo impetuoso bem lá no alto. Saio na última paragem … não chove, tiro o impermeável e guardo na mochila … trinco uma barra e uma maça e dou uma golada de água, ligo o relógio …  


…78km e 2200mD+ no total …  Balzers fica a 450m de altitude enquanto que Schaanwald sensivelmente a 470. O Liechtenstein tem o rio Rhein a fazer fronteira com a Suiça … no sentido em que fiz, de sul para norte, o rio é do lado esquerdo e vai servir-me de orientação. Junto ao rio as localidades mais importantes estão “encurraladas” do outro lado por um imponente maciço de montanhas, com vários picos bem acima dos 2000m (o mais alto a 2700) … não os consigo ver, está muito nevoeiro a partir do meio das montanhas. Quanto ao percurso não espero grandes dificuldades técnicas, pelo que li é de dificuldade média pela distância … trata-se de um passeio pela história do Liechtenstein, que nos irá levar aos Castelos, Igrejas, localidades importantes, florestas e tb um pouco à montanha (ponto mais alto a 1150m). Espero caminhos em terra, estradas florestais e muito alcatrão … vou ter isso tudo, mas tb vou ter algumas surpresas … prevejo 10 a 12 horas... vamos a isso ... 


1a etapa – Balzers-Triesenberg (14km/600mD+) 


A primeira coisa que fiz foi procurar as placas sinalizadoras do caminho – procurei ficheiros GPX nos dias anteriores mas não encontrei - iria ter que ser com os sinais do percurso. Sabia que junto ao Castelo havia de as encontrar e assim foi. Ao fim de pouco tempo fiquei descansado … tudo muito bem marcado. Esta etapa leva-nos pelo centro de Balzers, depois por caminhos exteriores em terra para então começar a virar para as montanhas, passando por uma localidade chamada Triesen “conhecida” por uma empresa antiga de transformação de algodão. Pelo gráfico são 8km mais ou menos planos para depois fazer a maior subida de todo o percurso e chegar a uma aldeia histórica (séc.13) chamada Triesenberg a 900m.  

Ia eu ainda no centro de Balzers e começou a picar-me ao fundo das costas de forma bastante violenta. Mal saí para o campo procurei um arbusto e estriei-me a adubar o Liechtenstein 😊 … tenho que actualizar a lista de países onde isso já aconteceu (mais de 20 com certeza 😊). 







Sentia as pernas pesadas e estava a suar bastante … a chuva ainda dava tréguas, não havia vento mas os 20 graus faziam a coisa estar abafada. Forcei um pouco correndo nas primeiras subidas. Queria ganhar algum tempo na primeira metade embora as pernas não estivessem com muita vontade.  

A subida a Triesenberg trouxe a primeira surpresa … além da inclinação brutal houve single-tracks com muita terra que com a chuva se transformou em lama … e o que é que eu levava calçado? Siiiiiiim … sapatilhas de estrada! Como adivinharam? Até parece que é costume. As minhas Glideride pouca tracção me davam. Não foi nenhum drama, mas desgastou um pouco mais e tive que ter cuidados especiais porque o trilho era muito estreito e do lado esquerdo a queda podia ser brava. 


Em Triesenberg vi novamente Lamas … o animal. Já tinha visto na aldeia onde estava o meu hotel e viria a ver daqui para a frente mais algumas vezes. Não faço ideia qual a utilidade destes animais ali, provavelmente apenas como animais de estimação. São giros mas não me ligaram nenhuma. O mesmo se passou com as vaquinhas que fui encontrando por caminho … não quiseram nada comigo ... os animaizinhos são antipáticos. Já das pessoas do Liechtenstein só tenho a dizer bem … cumprimentam sempre que passam por nós, todos a quem precisei de recorrer por algum motivo foram de uma simpatia inescedível.  





Demorei mais tempo do que esperava para esta etapa … começou a chover … toca a vestir o impermeável novamente … 


2a etapa – Triesenberg-Vaduz (10km/265mD+) 


Sinto-me melhor fisicamente … olhando para o gráfico desta etapa tenho a firme convição de que vou recuperar tempo. Täo enganadinho estava … 

Esta etapa leva-nos a subir quase 300m em 4km até Profatscheng, ponto mais alto do percurso (1150m) onde nos é prometida uma vista deslumbrante sobre o vale do Rhein. Subi de forma vigorosa … lá em cima o nevoeiro não deixa ver a vista prometida. 




Agora serão quase 700mD- para descer em 6km até à Capital Vaduz. Sabia perfeitamente que é muito ingreme mas achava que os ia fazer em estrada, ou seja, que os ia fazer a correr. Foi assim apenas em parte … metade foi feito em single-tracks pelo meio de uma floresta … muita lama escorregadia, 3 ou 4 escorregadelas e uma queda fazem disparar os meus alarmes. Foram provavelmente os 3km mais lentos de todo o percurso.  

Pelo meio passamos a ruína do Castelo Waldschloss e depois pelo ex-libris do Liechtenstein … o Castelo de Vaduz que aparece em tudo o que pesquisares sobre esta terra. E a verdade é que é imponente … um pouco antes, por volta dos 20km ligo para a Pikinita para dar noticias e dar tb um pouco descanso aos posteriores que se vão a queixar desta descida. 





Depois do Castelo a descida até Vaduz já é por caminhos asfaltados e escadarias … a chuva continua presente com alguns poucos intervalos secos.  

O percurso leva-nos pelo centro, muitas lojas, cafés, Museus até ao “Parlamento”... mesmo ao lado a Catedral St.Florin. Estava a ficar com fome e com calor … aproveitei um banquinho junto a uma fonte para descansar um pouco, e reabastecer de água. Dei-me algum tempo, hidratei bem, comi uma sandes que tinha levado e um pequeno chocolate. 4 horas para 25km … a média dava para o tempo final que queria, mas confesso que pensei conseguisse fazer esta duas etapas um pouco mais rápido. 



Lembro-me de ter chegado com 8,45min/km e de ter arrancado com 9,08m/km deste “abastecimento”. Os primeiros metros custaram mas depois entrei num trote certinho … o percurso ainda nos levou junto ao rio Rhein, a visitar uma ponte antiga que liga o Liechtenstein à Suiça e por fim dar uma volta dentro do complexo desportivo do Vaduz, o clube mais representativo da região. Está feita esta etapa ... 




3a etapa – Vaduz-Nendeln (17km/580mD+) 


Depois das voltas todas dentro de Vaduz esta 3a etapa iria levar-me novamente para as montanhas.  

Depois do “Gru Maldisposto” ter aparecido no final da etapa anterior (andar às voltinhas dentro de uma localidade quando estás cansado dá nisto) voltei a motivar-me e meti na cabeça que ia fazer esta etapa em 1h45 … os primeiros 10km são mais ou menos planos, para nos últimos 6km subires e desceres ca 300m.  

No inicio passo a parte velha de Vaduz (muitas casas de madeira tipicas, umas vinhas) sempre com o Castelo imponente no cima da montanha à vista. O percurso leva-nos à localida a seguinte, Schaan, onde passamos pelo centro, depois pelo convento St.Elisabeth para depois então atacar a tal subida de 300mD+ até Planken – o localidade mais pequena do Liechtenstein.  



Os primeiros km desta etapa tinham corrido muito bem, praticamente sempre a correr … o atingir o objectivo de 1h45 dependia do tipo de piso a subir, e especialmente a descer. A subida foi feita entre alcatrão, estrada florestal e um pouquinho de single tracks … sempre  a bom ritmo, o chamado caminhar vigoroso 😊 … lá de cima mais uma vez as vistas prometidas terão que ficar para uma próxima. Tinha receio que a descida fosse como a da primeira etapa. Ao inicio não foi, deu para eu correr mas a parte final foi novamente com mil cuidados, a ver onde colocar cada pé para não ir por ali abaixo … definitivamente, lama e sapatilhas de estrada não combinam.  





A chegar a Nendeln volta a chover com força … decido abrigar-me numa estação de autocarros para vestir novamente o impermeável. Aproveitei para abastecer, encher os flasks com sais e Guronsan Energy. Comi meia sandes, umas amendoas com sal e mais um chocolatinho.  

Tinha conseguido cumprir as 1h45 nesta etapa. A paragem atrasou-me um pouco mas mesmo assim vestava bem dentro do tempo pré-estabelecido para esta aventura. 


4a etapa – Nendeln-Rugell (15km/270mD+) 


Arranco cheio de confiança para esta etapa, de tal forma que entro na rua errada. Passado algum tempo parece-me que já tinha passado ali naquele sitio … estranho … quando dou por ela passo novamente na paragem de autocarro onde à pouco tinha estado a descansar. Enfim … 

De novo no percurso certo passo na estação de comboio que depois nos leva a dar uma volta dentro do complexo desportivo de Eschen/Mauren. O meu organismo está a pedir muitos liquidos nesta altura e já só tenho 1 ltr … vou atento a fontes mas por incrivel que pareça não aparece nada … em todo o percurso as fontes com água fresca são mais que muitas e agora nem ve-las.




Este percurso vai de localidade em localidade, por campos, vaquinhas a pastar, casas de madeira … tipicamente cenário alpino. Os quase 300m de desnivel positivo são feitos a partir dos 4km, em 3 subidas de ca.100m cada. Tranquilo … continuo num ritmo certinho. 




Em Aspen junto ao cemitério vejo um casa de banho pública. Nem é cedo nem é tarde … enchi dois flasks com água da torneira do cemitério 😊 … tranquilos porque não precisei de a beber … as fontes iriam voltar a aparecer umas atrás das outras. 

50km e ligo para a Pikinita e para os meus pais para os tranquilizar. 

Ao descer para Eschen sigo as marcações mas no centro da vila não encontro mais nenhuma e fico sem saber para que lado ir … tento várias estradas e nada de sinalização. Decido voltar a subir até ao último sinal do percurso … confirmo que não me enganei … volto a descer e encontro uma senhora a quem pergunto para que lado fica a Capela Rofenberger (tirei fotos a um guia para estas situações). Sigo as indicações dela e encontro a sinalização … siga … além do tempo perdido isto fez-me perder um pouco o ritmo com que vinha e a boa disposição





Chego a Bendern e volto às margens do rio Rhein … o percurso faz-nos passar num espaço desportivo com piscinas ao ar livre, parques para crianças, de skate e um bar em Gambrin … ora chove ora pára de chover … tem sido assim o dia todo … já guardei o impermeável e não o volto a vestir … estou todo molhado mas não tenho frio.  

Falta um último montinho para passar e chegar ao fim desta etapa a Ruggell. E assim só falta uma etapa … 


5a etapa – Rugell-Schaanwald (19km/510mD+) 

Entro cheio de moral em Rugell e é cheio de moral que coloco as pernas cansadas ao caminho que nos leva pelas ruas desta localidade até a um canal onde perco novamente a sinalização. Consulto o meu guia que me diz que depois desta localidade tenho que subir para uma terra chamada Schellenberg … sigo a minha intuição e passado uns 200m volto a encontrar os sinais do caminho.  

Foi sol de pouca dura … uma estrada cortada devido a obras corta o transito a peões tb. Dou a volta à Junta de Freguesia e encontro as placas mas sigo o sentido errado … só me apercebo à saída da localidade quando reconheço uma casa agricola por onde já tinha passado … e agora? … estou chateado e cansado com esta confusão … estava a correr tão bem páh.

Solução … encontrar o caminho para Schellenberg que tem um Castelo … lá devo voltar a encontrar as placas. Pergunto a uma senhora se Schellenberg fica na direcção em que vou …. diz que sim, sempre em frente a subir … entro pelo monte dentro, por trilhos e estradas florestais … tem vários cruzamentos mas eu confio na senhora e sigo sempre o mais em frente possivel, a subir … uns dois km mais à frente saio numa estrada … ligo o GPS do tlm para ver para que lado é … estou a ca.2km … sigo pela estrada, e já vejo a localida e o Castelo um pouco mais acima … tem que ser isto … e é mesmo. Um pouco antes do Castelo reencontro as placas do meu caminho … ufa ..., siga … 




Agora é seguir um antigo caminho de contrabandistas … até Mauren sempre a correr a descer durante 3 km. Passo pelo centro de Mauren e a única coisa que verdadeiramente me chama atenção é uma casa com uma bandeira portuguesa à janela. 






De Mauren a Schaanwald são uns 4km que faço a correr … doi-me tudo e já so quero acabar com isto … vai dar menos km que previsto, muito provavelmente por causa das confusões em Rugell no inicio desta última etapa. Que se lixe … a um km da “meta” começa a chover a sério … tinha que ser ...  😉 




Feito, bem dentro do tempo que tinha estabelecido … deu menos 3km que o oficial mas mesmo assim chegaria bem entre as 10 e as 12 horas. 

Foi uma bela de uma jornada que me deu a conhecer resumidamente o Principado do Liechtenstein. Fiquei a conhecer as localidades principais, a saber onde ficam, vi por fora praticamente todos os Castelos, Igrejas, Museus, Capelas, Campos de Futebol e piscinas da região que é absolutamente linda … um ambiente calmo, mesmo nas “cidades” que mesmo para Portugal não passariam de pequenas vilas. Ali vive-se a natureza, especialmente a montanha … pouca indústria vi, embora tenha visto algumas marcas de renome mundial ali com a sua sede (a HILTI por exemplo). Mas atenção a um pormenor … é extremamente caro … uma pizza e uma cerveja nunca por menos de 30 euros … não é apenas a legislação que é suiça, usam a mesma moeda que é o CHF (franco suiço) e o nivel de vida também. O que gostei mais? Mesmo que o ambiente dos Alpes e tudo que envolve seja qualquer coisa de maravilhoso o meu destaque vai para as pessoas … cruzei-me com dezenas de pessoas, não houve uma, desde as crianças mais pequenas aos mais velhos que não me tenham dedicado um “Hoy” sorridente que é o nosso equivalente ao “olá” … viajo muito e é muito raro ver isto …  

Bem, e foi assim o meu Liechtenstein Weg. Adorei embora me tenha ficado um ligeiro amargo de boca ao olhar para o alto das montanhas … são vários picos a cima dos 2000m que ficaram por visitar por causa do mau tempo. Lá terei que voltar um dia destes, quem sabe num verão 😉 

8 comentários:

  1. Muitos parabéns pela aventura! Deve ser um pais fantástico

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    1. Obrigado Sergio. É sim, muito bonito o Liechtenstein. Abraco

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  2. Já tinha saudades destas aventuras à moda do Perneta :) Há lá forma melhor de conhecer um país?! Parabéns pelo desafio superado e obrigada pela partilha das belas paisagens :)

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  3. Brutais como sempre as tuas aventuras! Abraço

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  4. Que espectáculo!!! Paisagens muito lindas e até lamas!
    E aquilo que é para fazer em 5 etapas, o auto-proclamado Tuga Doido fez numa :)

    Vou agora ao artigo seguinte

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    1. É o que faz ter tempo e estar sozinho ;). Sigaaaa...

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